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20 de Abril de 2024

Mantida decisão que impôs ordem do juízo arbitral a empresa que não participou da arbitragem

Por entender que o juízo estatal e o juízo arbitral devem coexistir em ambiente de cooperação, e que cabe ao Poder Judiciário conferir coercibilidade às decisões arbitrais a fim de garantir um resultado útil ao procedimento de arbitragem, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou a pretensão de uma empresa de não se submeter à ordem judicial que deu eficácia a uma decisão arbitral.

Durante a execução de contrato para a exploração e venda de minério de ferro, dois empresários instauraram procedimento na Câmara de Arbitragem Empresarial – Brasil, alegando descumprimento do ajuste segundo o qual deveriam receber um valor fixo por tonelada de minério retirado da Mina Corumi, na região de Belo Horizonte.

Eles disseram que estavam autorizados a fiscalizar a pesagem do minério na balança localizada na própria mina, mas foram impedidos de fazê-lo depois que os pagamentos cessaram.

A proprietária da mina opôs embargos de terceiros contra a decisão judicial que determinou que o Poder Judiciário desse cumprimento à carta arbitral por meio da qual os dois empresários tiveram assegurado o direito de acompanhar o processo de pesagem do minério. Alegou não ter nenhuma relação com a empresa envolvida no negócio controvertido e que não poderia sofrer os efeitos da decisão arbitral, já que não fez parte do procedimento de arbitragem.

Para o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), no entanto, a proprietária da mina teria de aceitar o cumprimento da ordem.

No recurso ao STJ, a proprietária afirmou que o Judiciário extrapolou a sua competência ao lhe determinar o cumprimento da ordem advinda do juízo arbitral, mesmo sabendo que ela não participou da arbitragem, pois é pessoa jurídica distinta.

Jurisdição concorrente

De acordo com a relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, é aceitável a convivência de decisões arbitrais e judiciais, "quando elas não se contradisserem e tiverem a finalidade de preservar a efetividade de futura decisão arbitral" – entendimento firmado pelo STJ ao julgar o REsp 1.277.725.

"A determinação de cumprimento de cartas arbitrais pelo Poder Judiciário não constitui uma atividade meramente mecânica. Por mais restrita que seja, o Poder Judiciário possui uma reduzida margem de interpretação para fazer cumprir as decisões legalmente exaradas por cortes arbitrais", explicou a ministra.

Sobre a convivência do juízo estatal com o arbitral, Nancy Andrighi afirmou que não se pode perder de vista que entre ambos deve existir sempre uma relação de diálogo e cooperação, e não uma relação de disputa, "o que enseja a necessidade de uma convivência harmoniosa e de atuação conjunta, para resolver de modo efetivo e eficiente os conflitos postos a julgamento arbitral".

De acordo com a relatora, essa necessidade de harmonia também se origina na ausência de poder coercitivo direto das decisões arbitrais, competindo ao Judiciário a execução forçada do direito reconhecido pela arbitragem.

Eficácia

Sobre o caso concreto, a ministra destacou que a impossibilidade de verificar a quantidade de minério produzido na mina em questão pode comprometer significativamente a eficácia de uma futura decisão dos árbitros.

"Dessa forma, a determinação feita pelo tribunal de origem, segundo a qual a recorrente deve suportar a vistoria pelos recorridos da quantidade de minério produzida pela mina durante o procedimento arbitral, não ofende a necessidade de consensualidade para a validez da cláusula compromissória que fundamenta o julgamento arbitral."

Quanto às relações societárias entre as empresas – questão que não ficou esclarecida no processo –, a relatora comentou que "não é o fato de supostamente a recorrente pertencer ao mesmo grupo econômico das empresas interessadas que pode fundamentar a ordem judicial, mas sim o próprio poder investido ao Poder Judiciário de conferir coercibilidade às decisões arbitrais, a fim de garantir-lhes seu futuro resultado útil".

RECURSO ESPECIAL Nº 1.798.089 - MG (2019/0045106-9)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE : EMPABRA EMPRESA DE MINERACAO PAU BRANCO S/A

ADVOGADOS : ANDRÉ MARTINS MAGALHÃES - MG104186

LEONARDO DE ABREU BIRCHAL - MG107140

LETÍCIA MORAES SEDER SOUZA AMARAL - MG112811

FERNANDA ALVIM RIBEIRO DE OLIVEIRA - MG100914

LEONARDO CANABRAVA TURRA - MG057887N

MARIA CECILIA DE OLIVEIRA REIS E ALVES - MG169167

PAULA CARNEIRO COSTA BAX DE BARROS - MG172626

IONE LEWICKI CUNHA MELLO - MG176044

RECORRIDO : JUAREZ DE OLIVEIRA RABELLO

RECORRIDO : JOAO HENRIQUE PEREIRA

ADVOGADOS : JOSÉ ANCHIETA DA SILVA - MG023405

MARIA FERNANDA DE OLIVEIRA LARCIPRETE - MG114089

INTERES. : GREEN METALS SOLUCOES AMBIENTAIS S.A

INTERES. : PHOENIX MINERACAO E COMERCIO LTDA

INTERES. : LUCAS PRADO KALLAS

INTERES. : RACHEL MARINHO DE OLIVEIRA KALLAS

INTERES. : LUIS FERNANDO FRANCESCHINI DA ROSA

INTERES. : MARCIA CRISTINA ZIMMER

INTERES. : B.L.T. EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS EIRELI

ADVOGADOS : AUGUSTO TOLENTINO PACHECO DE MEDEIROS - MG050741

CLAUDIA FERRAZ DE MOURA - MG082242

GUILHERME DE CARVALHO DOVAL - MG102228

DANIEL FREITAS DRUMOND BENTO - MG154885

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. ARBITRAGEM. OMISSÃO,

CONTRADIÇÃO E ERRO MATERIAL. AUSÊNCIA. MULTA. INTUITO

PROTELATÓRIO. AUSÊNCIA. ALCANCE DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA.

COMPLEXA REDE CONTRATUAL E DE EMPRESAS. EXPLORAÇÃO DA MINA

CORUMI. NECESSIDADE DE VERIFICAÇÃO DA PESAGEM DO MINÉRIO.

CONSENSUALIDADE DA ARVITRAGEM. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO. RESTRITA

MARGEM DE INTERPRETAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. RESULTADO ÚTIL DA

DECISÃO ARBITRAL.

1. Agravo de instrumento interposto em 28/08/2017. Recurso especial

interposto em 09/07/2018 e concluso ao gabinete em: 28/02/2019.

2. Ante a ausência de omissão, contradição e erro material, não há violação

ao art. 1.022 do CPC/2015.

3. O fato de o Tribunal de origem ter afastado os argumentos da recorrente

não significa, necessariamente, que há intuito protelatório por parte da

recorrente. Na hipótese, a recorrente apontou diversas questões relevantes

e que exigiu do Tribunal de origem uma longa explicação para afastar a

presença dos supostos vícios.

4. Como afirmado no julgamento do REsp 1.277.725/AM (Terceira Turma,

DJe 18/03/2013), “admite-se a convivência harmônica das duas jurisdições -

arbitral e estatal -, desde que respeitadas as competências correspondentes,

que ostentam natureza absoluta”. Portanto, é aceitável a convivência de

decisões arbitrais e judiciais, quando elas não se contradizerem e

tiverem a finalidade de preservar a efetividade de futura decisão arbitral.

5. A determinação de cumprimento de cartas arbitrais pelo Poder Judiciário

não constitui uma atividade meramente mecânica. Por mais restrita que

seja, o Poder Judiciário possui uma reduzida margem de interpretação para

fazer cumprir as decisões legalmente exaradas por cortes arbitrais.

6. Na hipótese, não é o fato de supostamente a recorrente pertencer ao

mesmo grupo econômico das empresas interessadas que pode fundamentar

a ordem judicial, mas sim o próprio poder investido ao Poder Judiciário de

conferir coercibilidade às decisões arbitrais, a fim de garantir-lhes seu

futuro resultado útil aos participantes daquele procedimento.

7. Recurso especial conhecido e parcialmente provido somente para afastar

a aplicação da multa prevista no art. 1026, § 2º, do CPC/2015.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira

Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas

taquigráficas constantes dos autos Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr.

Ministro Moura Ribeiro,, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso especial nos

termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino,

Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra.

Ministra Relatora.

Brasília (DF), 27 de agosto de 2019 (Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora

Fonte: STJ - Superior Tribunal de Justiça

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